quinta-feira, novembro 04, 2004

1. Tales de Mileto (séc. VI a.C.)

Considerado o mais antigo físico grego, Tales predisse um eclipse que se verificou em 585 a.C.. Assim, a sua actividade não teria lugar numa data muito anterior ao começo do século sexto.
De ascendência fenícia, é desenhado por Heródoto como político e engenheiro, para além de astrónomo.

Anedotas acerca de Tales

Platão Teeteto 174 A ...: "precisamente como, Teodoro, se diz que uma ladina e graciosa escrava trácia troçou de Tales por este ter caído a um poço, enquanto observava os astros e olhava para o céu. Dizia ela que Tales, ansioso por conhecer as coisas do céu, não se dava conta do que estava atrás dele e mesmo a seus pés."

Aristóteles Política A 11, 1259 a 9: "Pois quando o censuraram por causa da sua pobreza, com o argumento de que a filosofia para nada servia, diz-se que, tendo previsto pelo estudo dos corpos celestes que ia haver uma abundante colheita de azeitona, juntou um pequeno capital, ainda durante o Inverno, e pagou sinal por todos os lagares de Mileto e de Quios, arrendando-os por baixo preço, porque ninguém licitou contra ele. Quando chegou a ocasião própria, houve uma súbita afluência de pedidos de lagares; então ele sublocou-os pelo preço que quis, e deste modo obteve um lucro avultado, demonstrando assim que é fácil aos filósofos enriquecer, se o desejarem, mas que não é isso o que lhes interessa."

Descobertas de Matemática

Jerónimo de Rodes atribui a Tales o mais simples método para medir a altura de uma pirâmide:
a altura de uma pirâmide está para o comprimento da sua sombra, exactamente como a altura de qualquer objecto vertical mensurável está para o comprimento da sua sombra no mesmo momento do dia.
A sua obra matemática estaria intimamente ligada a resultados de medições não estritamente empíricas, ainda que sem necessariamente definir princípios rigorosos de geometria.

Cosmologia

1. "A terra flutua na água, que é a origem de todas as coisas."

Aristóteles de caelo B 13, 294 a 28: "Outros dizem que a terra repousa sobre a água. Com efeito, é esta a versão mais antiga que recebemos, dada, segundo dizem, por Tales de Mileto, a saber: ela mantém-se no devido lugar pelo faco de flutuar como um madeiro ou algo de semelhante (pois nenhum destes corpos se mantém, por natureza, no ar, mas na água) - como se o mesmo argumento se não aplicasse tanto à água que suporta a terra como à própria terra."

Aristóteles Metafísica A 3, 983 b 6: "Na sua maior parte, os primeiros filósofos pensaram que os princípios, sob a forma de matéria, foram os únicos princípios de todas as coisas: pois a fonte original de todas as coisas que existem, aquela a partir da qual uma coisa é primeiro originada e na qual por fim é destruída, a substância que persiste, mas se modifica nas suas qualidades, essa, afirmam eles, é o elemento e o primeiro princípio das coisas existentes, e por essa razão consideram que não há geração ou morte absolutas, com base no facto de uma tal natureza ser sempre preservada ... pois deve haver alguma substância natural, uma ou mais do que uma, de que provêm as outras coisas, enquanto ela é preservada. Contudo, sobre o número e a forma desta espécie de princípio nem todos estão de acordo; mas Tales, o fundador deste tipo de filosofia, diz que é a água (e por consequência declarou que a terra está sobre a água), tendo talvez formulado esta suposição por ver que o alimento de todas as coisas é húmido, e que o próprio calor dele provém e vive graças a ele (aquilo de que provêm é o princípio de todas as coisas) - formulou a hipótese não só a partir disto, como ainda do facto de os embriões de todas as coisas terem uma natureza húmida, sendo a água o princípio natural das coisas húmidas."

Esta opinião, de que a terra flutua na água, parece ter tido base na cosmologia mitológica do antigo Próximo-Oriente. No Egipto, a terra era concebida como um prato raso em repouso sobre a água; na epopeia babilónica da criação Apsu e Tiamat representam as águas primordiais, e Apsu subsiste como água subterrânea, depois de Marduk rasgar o corpo de Tiamat para formar o céu e a terra.
O retrato aristotélico do filósofo leva a pensar que este consideraria a água como princípio material, a partir do qual era constituído todo o mundo visível; não se pode no entanto, com plena certeza, afirmar que era este de facto o pensamento do filósofo.

2. "Mesmo os seres aparentemente inanimados podem estar 'vivos'; o mundo está cheio de deuses".

Aristóteles de Anima A 2, 405 a 19: "Parece que também Tales, a avaliar pelo que se conta, considerava a alma como algo de cinético, se é que ele disse que a pedra [de Magnésia] possui alma pelo facto de deslocar o ferro."

Diógenes Laércio I, 24: "Aristóteles e Hípias afirmam que ele partilhou a alma até pelos objectos inanimados [à letra: sem alma], servindo-se da pedra de Magnésia e do âmbar como indício desse conceito."

Aristóteles de Anima A 5, 411 a 7: "E alguns afirmam que ela [a alma] está misturada no universo: foi, talvez, por essa razão que Tales também pensou que tudo está cheio de deuses."

Para Tales a alma era algo de dinâmico, fonte de vida; e mais do que esse princípio vital estar contido individualmente em cada coisa, todas as coisas comparticipariam dele formando um todo orgânico, ainda que nalgumas categorias da matéria pudesse estar ausente.

Bibliografia

1. G.S. KIRK, J.E. RAVEN, M. SCHOFIELD, "Os Filósofos Pré-Socráticos", 4ª edição, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1994.